terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

O grito do inconsciente

Chorei muito quando aqui cheguei. Não entendia o que ocorria.
Luzes acendiam por onde ocorriam pensamentos que ascendem nossa existência.
Mesmo assim chorava. Não queria acreditar que tudo estava acabado.
Chorei lagrimas não choradas antes. Eram como se fossem nascentes de um rio.
Todo aquele sentimento reprimido é agora forçado a ser expelido da alma.
Parecia um ritual de purificação. Quando me dei conta, observei vários outros assim como eu, pensando e chorando.
Todos lamentavam alguma coisa, alguns conversavam consigo mesmo, outros debatiam-se no chão buscando apoio.
Em um momento pensei que chovia, pois os rostos molhados lembravam uma leve chuva lambendo nossos rostos.
Sentei próximo a uma senhora. Sua tristeza me impressionava. Quando percebeu minha presença, disse: - Não fiz metade do esperado.
Em outro momento, ouvi uma conversa entre dois jovens. Lamentavam seus desenganos.
Percebi também uma criança aflita à procura dos pais. Juntos fomos à procura deles.
Logo em seguida constatei que todos aqueles que ouvi refletiam minha imagem, faziam parte de mim.
Lembrava dos projetos que não realizei. Nesse exato momento a imagem da senhora triste misturou-se a minha.
Lembrava dos desenganos. Todos os lamentos dos jovens penetraram meus pensamentos.
Diante desse cenário desolador, lembrei dos meus pais. A criança surgiu em minha memória. Estavam sempre dispostos a me ajudar.  Porque não procurei o apoio deles?
Queria volta para revê-los.
Mas estava aqui, em um lugar desconhecido, completamente estranho, onde nunca estive.
Como cheguei? Como pude parar aqui?
Quanto mais libertava minhas lamentações, mais ouvia os gritos de um eco sofrido. Quanta tristeza!
Aquela senhora disse: - A culpa foi sua. Perdeu seu precioso tempo!
Os jovens aproximaram-se e perguntaram ao mesmo tempo: - Gostou de ser enganado? O desengano dói!
E a criança? Quando estava em desespero apareceu, segurou minha mão e disse: 
- Seus pais estão chamando. Venha!
Adormeci.
Segundos depois lá estava. Deitado no sofá da minha casa sendo acolhido por meus pais.
Disseram que tinha tentado o suicídio, mas a dose do medicamento não foi suficiente.
O medicamento apenas tinha aberto meu inconsciente, revelando meus lixos mentais armazenados.
Agora que já estou melhor, não perderei tempo. Serei fiel a mim mesmo.
Não quero voltar aquele local novamente. 
(Texto baseado no relato de um jovem após tentar o suicídio).
O Grito, 1893, óleo sobre tela, 91 x 73 cm. Edvard Munch